Em meados de Julho, no Estado de
Michigan, (EUA), a cidade de Detroit foi declarada em bancarrota. Como se sabe,
quando estão em jogo poderosos interesses económicos, a democracia fica na
gaveta e, em consequência, foi nomeado um administrador da cidade, que
dispensou naturalmente a realização de eleições.
Mandatado pelos bancos, com desembaraço,
o expedito “administrador de emergência”, recrutado entre os
quadros da Wall Street, apressou-se a declarar que, se a cidade, pretendia
pagar a dívida de 20 mil milhões de dólares, não poderia continuar a ser pagas
reformas e pensões, nem seguros de saúde.
Importa esclarecer que Detroit não é
(era?) uma cidade qualquer. Esta metrópole foi considerada, após a 2ª Guerra
Mundial, como “cidade motor dos EUA”
e, em muitos aspectos, foi proclamado modelo do desenvolvimento capitalista.
Foi a quarta maior cidade norte
americana, com quase dois milhões de habitantes, profundamente ligada à
indústria automóvel, sede das doze empresas mais ricas do mundo, entre elas a
General Motors e a Ford. Em 1960, com uma força de trabalho altamente
qualificada de 300 mil postos de trabalho, a cidade gerava o maior rendimento per capita
dos Estados Unidos.
Chegou agora aquilo que alguma imprensa
norte americana designa pelo “truque da
bancarrota”. Nada que o capitalismo não pratique em todo o Mundo. As “falências” constituíram sempre e
continuam a ser, como os portugueses bem sabem, pretexto para ataque feroz aos
direitos sociais e políticos dos trabalhadores, pensionistas e dos cidadãos em
geral.
No caso da cidade de Detroit, os dois milhões
de pessoas, que há poucos anos, constituíam a sua população, estão hoje
reduzidos a 700 mil habitantes, mais de metade dos quais se encontram desempregados.
A pobreza e a miséria grassam. Velhos e crianças são as maiores vítimas.
Como se sabe, com a crise capitalista
declarada em 2008, o sistema financeiro norte-americano (e europeu) foi salvo
com milhares de milhões de dólares de apoios e subsídios estatais, pagos
naturalmente pelos contribuintes. Mas quando se trata da vida, do trabalho e do
bem-estar dos cidadãos a “lógica” do
sistema funciona de outra maneira. Os bancos credores lançam-se como abutres
sobre o corpo exangue da cidade e sugam até a medula “os salvados” do naufrágio
económico, de que são os responsáveis imediatos.
Com o colapso das receitas dos impostos
e na falta de apoios do Orçamento Federal, tão pródigo para o sistema financeiro,
o orçamento da cidade entrou em derrapagem; os obscuros contractos (entre os
quais os célebres swaps) e as taxas de juro dos “produtos financeiros”, manipuladas
ao sabor dos interesses dos bancos credores, estrangularam a pujante vida
económica de outrora e tornaram impossível a vida naquela urbe.
Em muitos aspectos, a cidade de Detroit
é descrita como uma cidade fantasma. Os cortes no orçamento da cidade, tem consequências
inimagináveis nas despesas sociais: 60% das crianças em situação de extrema
pobreza, redução a 40% da iluminação pública, esquadras de polícia encerradas,
serviços de educação e saúde degradados.
Cerca de um terço da superfície urbana
da cidade ocupada por prédios desabitados e em ruínas...
Como se compreende, a degradação da vida
da cidade provoca e acelera a fuga da população para outras paragens, reduzindo
a base material da recuperação económica e o volume das receitas fiscais e aprofundado assim
a espiral depressiva para onde a cidade de Detroit foi lançada.
Entretanto, Wall Street e os gigantes financeiros,
que integram os bancos credores (UBS, Banks of América, Merill Lynch, JP Morgan)
sugam as entranhas da cidade...
Até obras de arte dos museus são leiloadas
para saciar a gula vampiresca...