sexta-feira, junho 29, 2012
terça-feira, junho 26, 2012
Indizivel Linha...
Imperturbável paisagem
ante meus olhos.
O gavião soletra
o voo nas alturas
E a dócil pomba
se aninha
No reverso das
horas que serpenteiam
A cinza dos
passos calcinados...
O tempo
suspende-se nesta nesga de vida.
Nada na canícula
perturba o deslizar da memória.
Nem o ouropel do
sonho.
Nem o horizonte
fugidio.
Indizível linha
que se agiganta como espera...
Nem a sombra do
acaso.
Nem o olhar da
inocência.
Apenas o gomo
matricial
Nos lábios
ressequidos. E a agitação no peito
Que em nada se
despenha. E perdura...
Como serpente
mordendo a cauda...
segunda-feira, junho 25, 2012
sábado, junho 23, 2012
“Indícios claros”, disse ele!
Adivinhava-se... O múnus presidencial de
“cumprir e fazer cumprir a Constituição
da República” leva tratos de polé, com Cavaco Silva. Como se comprova
agora, mais uma vez, com a expedita promulgação da legislação do trabalho,
recentemente aprovada na Assembleia da República pela maioria governamental, a
manifesta demissão do PS e as mesuras da UGT no contexto da dita “concertação
social”.
“Não
foram identificados indícios claros
de inconstitucionalidade”- assim proclamou
Sua Excelência, com sua peculiar finura, em presidencial comunicado, para
justificar a sua cumplicidade operante com a maioria e a deserção ao seu dever
de consultar o Tribunal Constitucional, conforme o art.º 278, da CRP
estabelece.
Nisso ultrapassou a própria tróica que,
no “pacto de submissão” de Maio de
2011, teve a subtileza de considerar que as reformas preconizadas teriam em “consideração as possíveis implicações constitucionais”,
no reconhecimento explícito dos limites materiais da almejada reforma da
legislação do trabalho e da segurança social.
Mas para Cavaco Silva não! A
Constituição da República e, sabe-se lá, se a própria Democracia são assuntos
descartáveis em função do seu fundamentalismo financeiro e o zelo de “bons
alunos”, que são o alfa e ómega de toda a acção política.
Pois não é verdade que, alguém da sua
corte, entre a ironia e a convicção, afirmou que a democracia deveria ser
suspensa até o problema das finanças públicas estar resolvido? A excelsa senhora
vem dando o dito por não dito, mas a afirmação por aí anda, a ilustrar seus
pergaminhos. Mais recentemente, o presidente da Câmara do Porto, sem pingo de
escrúpulos, uma vez que reincidente, defendeu acabar-se com as eleições nas
autarquias endividadas...
Tudo boa gente, que Cavaco Silva
politicamente acarinha...
Acontece que, no caso em apreço, não há
escapatória. O artifício semântico não pode iludir o que entra pelos olhos
dentro. Cavaco Silva mandou às malvas a Constituição da República, como fará
sempre que os interesses políticos, que o movem, estejam em causa.
Chamei-lhe artifício, mas mais adequado
seria dizer sofisma. Em boa verdade, invocar a ausência de “indícios claros” não é nada. Se os indícios são “claros” não serão indícios, mas evidências, isto é, certezas. E, no caso
de certezas, isto é, quando a inconstitucionalidade das normas sujeitas a
promulgação é evidente, a defesa da
constituição que o veto presidencial deve assegurar, dispensa qualquer parecer
do Tribunal Constitucional.
O parecer do Tribunal Constitucional
apenas tem justificação, quando no exercício do acto de promulgação das leis,
ao Presidente se levantem dúvidas sobre a adequação ao espírito e letra da
Constituição de alguma das normas da legislação ordinária presente para
promulgação.
Por outras palavras, o parecer do
Tribunal Constitucional justifica-se quando a legislação ordinária a promulgar
apresente indícios (apenas indícios –
nem “claros”, nem escuros) de não conformidade com os valores jurídicos e
políticos plasmados na Constituição da República, não havendo outro critério de
intervenção presidencial (ou ausência dela) que não sejam esses.
..............................................................
É público que Cavaco Silva não sabe
latim (F. do Amaral, dixit). Mas, se à sua esmerada cultura de amanuense
acrescentasse um pouco de “humanidades” ficaria a saber que existem palavras
que não admitem adjectivação - são ou não são, simplesmente!... E nessa
dialéctica de ser ou não ser esgotam
todo o seu sentido e razão.
A palavra indícios será uma delas. Como são seriedade e probidade
intelectual. Ou ética política tão em falha nos dias de hoje...
domingo, junho 17, 2012
"COMUNICAÇÃO SOCIAL E PODER " - Breves anotações à margem...
1 - A configuração do poder é
multifacetada. Assume diversas máscaras numa encenação do Mesmo, quer dizer, da
articulação dos interesses económicos dominantes, instância última onde reside
o verdadeiro rosto (invisível) do Poder.
Primeira
consequência: não há apenas um sistema formal de poder, mas uma multiplicidade
de sistemas de poder, disseminados no interior da sociedade, muitos dos quais
meros poderes fácticos, que dizer,
sem qualquer estrutura (visível) que os suporte.
Segunda consequência: nenhum sistema de
poder é, em si mesmo, autónomo e independente dos restantes: os diversos
sistemas de poder desdobram-se uns nos outros, funcionando em rede, retroagindo
nos respectivos chamamentos. Decorre, portanto, que o poder não é apenas o “lugar de poder” que se observe, se
ocupe, máxime se conquiste, mas
sobretudo uma “relação de poder” que
se exerce e se sofre – não há poder,
sem “exercício do poder”...
2 - O poder de Estado
tem assumido o lugar por excelência do “exercício
do poder”. Compreende-se. O Estado, nas sociedades politicamente
organizadas, detém o monopólio da violência. É o único sistema de poder que se
poderá impor pela força e pelo constrangimento físico. Quer dizer, o poder Estado
é essencialmente coercivo...
Como é óbvio, a “domesticação” da violência através do poder de Estado representa um
avanço histórico incalculável, hoje em dia; tal não significa, porém, que a
violência não faça parte da sociedade e, em determinados contextos
histórico-sociais, não possa ser ela própria “parteira” do devir social.
3 - Outros sistemas de poder actuam na
sociedade, porém. Não pela coerção, mas pela persuasão; não pela imposição da
lei e da ordem ou pela violência física se necessário, mas pelas artimanhas da
ideologia. De forma mais subtil, portanto. E em imbricada cumplicidade com o poder de Estado. Como acontece com o poder mediático.
É na propagação de uma ideologia que o “poder mediático” se cumpre. Poder mediático que excede o papel dos
órgãos da comunicação social e quadro do constitucional direito à informação, para envolver a indústria do entretenimento,
as agências de comunicação, a publicidade, o marketing, o consumo, o sistema de
moda, o desporto e tantos mais - uma vasta panóplia de meios, que encenam
aquilo que alguns designam por “Sociedade
do Espectáculo”.
4 - Os meios são diversos. O fito,
porém, é sempre o mesmo – a neutralização
do poder dos cidadãos, pela
aceitação acrítica da ideologia. Então as diversas configurações do poder mediático, em apoteose de efeitos,
proclamam a “inevitabilidade” da vida quotidiana, sem qualquer hipótese de
remissão.
Seja pela angústia ou pelo medo. Seja
pelo hedonismo do consumo e do lazer. Seja pelo culto do “parecer” (mais que o “ser”,
ou mesmo o “ter”) o que importa na
dita “Sociedade do Espectáculo” é
isolar e atomizar o individuo, massifica-lo, desmembra-lo da sua condição de
cidadão, inibi-lo na sua autonomia, frustrar a fecundidade da participação
social e assim o submeter voluntariamente
aos ditames da ideologia dominante e dos interesses económico-financeiros que
serve e a justificam.
Como romper o cerco?
quarta-feira, junho 13, 2012
segunda-feira, junho 11, 2012
O Providencial Homem de Massamá...
Manifestamente Passos Coelho anda
deslumbrado. Não apenas porque o País deixou de estar “à beira do abismo”, pois
que, sob a sua batuta, está a dar os fatídicos “dois passos em frente”, mas
porque, embebecido, descobre agora, face à austeridade, “a extrema paciência
dos portugueses”.
Como se sabe, as palavras do
primeiro-ministro têm sido glosadas em diversos tons. Até um distinto clérigo,
bispo da Igreja Católica, despiu seu discurso do peso das sedas e cambraias e,
sem papas na língua, como que expulsando os “vendilhões do templo”, sugeriu aos
portugueses para saírem à rua, não para fazerem desacatos, mas para afirmarem
seu protesto.
No dizer do eminente dignatário da
Igreja Católica, as considerações do primeiro-ministro lhe fazem lembrar os
tempos do fascismo. E, expressivamente, assinalou que o discurso daquele “senhor que pelos vistos ocupa as funções de
primeiro-ministro” lhe parecia ouvir “o
discurso de uma certa pessoa, há cinquenta anos”, numa óbvia aproximação
das palavras de Passos Coelho ao discurso oficial do salazarismo sobre a “mansidão” do Povo português e dos “safanões a tempo”, presume-se...
Houve logo quem quisesse
cruxificar o clérigo, e – ai Jesus! – que Passos Coelho tem legitimidade
democrática e o bispo não tem credibilidade política!...
Como se o problema
fosse a “equipação de legitimidades”, entre ditadura e democracia, e não outro
bem mais subtil, mas nem por isso menos determinante, ou seja, a equipação do
“discurso”, quer dizer, da “ideologia” que, vinda do passado, ainda se mantém
viva (e ao que parece actuante) no pensamento (político) do actual
primeiro-ministro.
Como miasmas que inquinam a corrente da
história...
Do alto do seu discurso do “Dia de
Portugal”, o Presidente da República, num óbvio puxão de orelhas ao
primeiro-ministro, pretende emendar o tiro. E, naquilo que Passos Coelho vê um
povo paciente e resignado, Cavaco Silva encontra a “sabedoria” do (bom povo)
português.
Seja como for, quer o “homem de Massamá”, quer o “homem de Boliqueime”, são expressão da
mesma pulsão ideológica, em que o povo, qualificado de “paciente” ou “sábio”, é
desligado da condição de obreiro da sua própria história.
O povo é, neste
contexto, “mitificado” como corpo social ideal, onde se projectam apenas os
“efeitos da política”, mas cujos desígnios lhe são alienados, ficando
permanentemente reservados a uma restrita casta de “eleitos”.
Como se sabe, foram as concepções
doutrinárias do fascismo que estabeleceram este “desdobramento” da política.
Por um lado, mitificando o Povo inorgânico e afastando-o da participação
política e, por outro lado, erguendo os líderes como os “autênticos intérpretes
da vontade colectiva”.
Logo os consagrados (e exclusivos) intérpretes da acção
política...
Dir-me-ão que, em democracia, as
eleições determinam a formação de maiorias e a formação dos governos. Sem
dúvida. Nem estas linhas pretendem sugerir qualquer iminente “regresso ao
passado”.
Digo apenas, louvando-me nas palavras do
ilustre dignatário da Igreja, que o discurso político dominante, a permanente
“mitificação” do povo, enquanto lhe arrancam coiro e cabelo e uma certa cultura
de casta, a quem tudo é permitido, remetem indiscutivelmente para a matriz
cultural e ideológica do salazarismo.
Como escreveu Augusto da Costa Dias,
noutro contexto: “O passado sofre a mesma
degradação a que se submeteu o quotidiano presente. Desvendou, sob as fraldas
da “aparência”, o maravilhoso oculto. E, mais fácil de mistificar, mais
atraente no seu vago impreciso (...) hipertrofia-se como categoria ideológica e
acaba por sobrepor-se ao presente".
Não desarmemos, pois, perante a luta.
E, assim, saibamos destruir o “ovo da serpente”...
[1]
- Augusto da Costa Dias – in “Crise da Consciência Pequeno-Burguesa – Os Vivos e os Mortos”
Editora Arcádia.
domingo, junho 10, 2012
quinta-feira, junho 07, 2012
terça-feira, junho 05, 2012
... No dia dos teus (cinco) anos
António
Que a vida não tarda...
Por agora
Que a vida não tarda...
Por agora
Os fios do baloiço
De que sou vértice – assim espero! –
Na vertigem de teu voo...
Em breve
Em breve
O tropel do Mundo
E o“velo de oiro” em cada rosto
E o perfume da partilha em cada gesto...
E o perfume da partilha em cada gesto...
Sobe a árvore, sobe
António!
E come chocolates, menino,
Que a vida passa:
- “Olha que não há mais metafísica no mundo
senão chocolates”...
sábado, junho 02, 2012
PAUL ÉLUARD - Poema "Aviso"
"A noite que
precedeu a sua morte
Foi a mais breve
de toda a sua vida
Pensar que
estava vivo ainda
Era um fogo no
sangue até aos punhos
A sua força era
tal que ele gemia
Foi quando
atingia o fundo deste horror
Que o seu rosto
num sorriso se lhe abriu
Não tinha apenas
um único camarada
Mas sim milhões
e milhões de camaradas
Para o vingarem
sim bem o sabia
E então para ele
ergue-se a alvorada..."
Paul Éluard
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