quinta-feira, dezembro 29, 2011

Sobrevivente(s) a tantos deuses mortos...



Na mitologia grega, o mirto era consagrado a Afrodite. Também na mitologia romana, em que Vénus detinha título de Múrcia (de mirto ou murta).

Desde a antiguidade que esta espécie arbórea está relacionada com rituais e cerimónias solenes - os gregos adornavam as noivas com grinaldas de flores mirto, como ainda hoje, por vezes, acontece.

Das folhas e madeira do mirto era extraída a mirra, uma das oferendas do Presépio.

.................................................................

 A UM MIRTO

Nascido antes de Cristo
Uma vez mais floriu
O velho e agora jovem mirto.

Junto ao poço as suas fundas raízes
E o mesmo vivo, sempre generoso
Aroma das folhas; o tronco
Torturado por nodosas chagas,
Cavernas, golpeado de musgo e cobre
Mas com baixos, com tenazes rebentos.

Quantos anos aqui perdeste, quantos
Se amarram à tua sombra?
Alguém como eu acaso te beijou?
Quantos passos em volta? Quanta chuva
Desejou o Romano que para aqui te trouxe?
E a quantas exalações da vida assististe
Como muda testemunha, ó corpo mediterrâneo
Sobrevivente a tantos, tantos deuses mortos?

António Osório
Poeta português, nascido em Setúbal – 1933.

A Raiz Afectuosa” (1972), “A Ignorância da Morte” (1978), “O Lugar do Amor” (1981), “Décima Aurora” (1982), “Adão, Eva e o Mais” (1983) são alguns dos seus livros.

..........................................................................

Sejamos Mirto!...

BOM ANO...

.


terça-feira, dezembro 20, 2011

SUAVES SORTILÉGIOS...

VOTOS DE NATAL FELIZ...
com Saúde, Paz e Alegria.

(apesar dos tempos...)
...................................................................................................................................................


Suaves sortilégios...

Falam-me estes dias de suaves sortilégios
Quando os olhos sorriam na ternura de um afago
E teu regaço, Mãe, era altar e refrigério …

Não havia profusão de cores. Nem artificio.
Tudo se resumia à singeleza de teus dedos
Ajeitando o musgo sobre a pedra.
E a imaginada gruta onde construías o milagre
Aninhando-se em mim: – Deus menino!...

(Que o outro Menino era apenas pretexto.
Natal que tu não sabias, então, Mãe, mas eu sei.
Hoje!...)

E a mãe celeste era a amorável devoção
Com que enfeitavas o caminho. E deitavas
Nas palhinhas o meu olhar deslumbrado
E o doce encantamento…

E a liturgia imaculada do presépio!...
E esta eterna dor da ausência. E tua presença
Iluminada que pressinto em cada passo…    




segunda-feira, dezembro 19, 2011

Em memória de José Dias Coelho...


José Dias Coelho nascido em Pinhel a 19 de Junho de 1923 - artista plástico.
Militante e dirigente do Partido Comunista Português.
 
Assassinado pela PIDE, em Lisboa, a 19 de Dezembro de 1961

quarta-feira, dezembro 14, 2011

Capitalismo versus Democracia…


Há uns anos atrás, nos alvores dos anos 2000, o célebre financeiro George Soros, num livro sugestivo com o título “A crise do capitalismo global – a Sociedade Aberta Ameaçada”, interrogava-se – cito de memória – “se a democracia seria compatível com o sistema capitalista”.

E, na sua tese, considerava que embora o capitalismo esteja associado à democracia e lhe tenha servido como legitimação ideológica, considera o financeiro que há quem sustente ser necessária uma “certa forma de ditadura para que o desenvolvimento se desencadeie”.

Pois não é verdade que, entre nós houve quem, enquanto ministra das Finanças, tivesse sugerido a “suspensão da democracia por uns tempos” até as contas públicas ficarem em ordem. Procurou a pessoa em causa rectificar depois, como se ironia fosse, mas o agravo à democracia ficou. Sem remissão…

Face à gravidade da situação, os desenvolvimentos posteriores da crise do sistema capitalista têm vindo a fazer tocar as campainhas de alarme e a sobressaltar os espíritos mais lúcidos e as consciências mais inquietas.

Em Wall Street, centro nevrálgico do capitalismo global, a tensão entre capitalismo e democracia explode, com o movimento “Occupy Wall Street”. Para a opinião pública norte-americana este embate entre capitalismo e democracia deve soar com muita estranheza e perplexidade.

Porventura capitalismo e democracia não foram sempre considerados, no chamado mundo ocidental, como irmãos siameses e indelevelmente inscritos nos actos fundadores da grande nação norte-americana? Esse foi também, sem dúvida, para os governantes e opinião pública norte-americanos o leitmotiv durante a guerra fria, para quem, na sua propaganda, comunismo e democracia seriam incompatíveis.

Mas depois da guerra fria as coisas complicaram-se. É verdade, que após o colapso da URSS, os políticos norte-americanos e os intelectuais que por todo o mundo os servem quiseram fazer-nos acreditar que levar o capitalismo à China seria a proclamação da democracia naquele país. Vê-se agora o tamanho da presunção. A China está sentada numa montanha de títulos de dívida pública norte-americana, sem o mínimo abalo no regime político, que sustenta os enormes ritmos de crescimento e exploração.

Se nos quisermos aproximar da realidade europeia, então constataremos que a democracia, a “tal santa que continua mumificada nos altares” como diria Saramago, tem sofrido, nos últimos tempos, trato de polé. Em nome da austeridade, as grandes instituições financeiras abriram, sem pudor, guerra aberta aos governos e instituições democráticas.

Assistimos, assim, estupefactos, a que os ditos mercados capturem a democracia, de forma deliberada e pensada. Políticos, no exercício de funções governativas, na Finlândia, sustentam, sem pudor, que os seis países da zona euro, com a classificação triplo AAA, deveriam ter “mais voz” nos assuntos económicos europeus que os onze membros restantes. E, assim, a Europa meridional ficar subordinada politicamente à Alemanha e à Escandinávia e, em última análise, aos ditames da classificação creditícia pelas agências especializadas.

Mais grave ainda é que tais ideias fazem caminho nas instâncias comunitárias, como foi bem patente nos últimos desenvolvimentos, em que a democracia (mitigada) no funcionamento da União Europeia se vergou à vontade da senhora Merkel.

Bem vistas as coisas, o que os denominados mercados estão a fazer é ilidir a componente de igualdade social dos indivíduos e Estados, inscrita na matriz da Democracia e na génese da revolução liberal, para em alternativa, estabelecerem o principio não de “um homem (ou um Estado) um voto”, mas o princípio de “um euro, um voto”, quer dizer, a necessidade de ser proprietário (deter poder económico) para se poder ser benificiário da Democracia.

Uma regressão histórica que nos remete para o século XVIII, em que o direito propriedade estava acima de qualquer legalidade constitucional…      


quarta-feira, dezembro 07, 2011

"Mais vale morrer reinando, que acabar servindo"...


Luísa de Gusmão, nascida em 13 de Outubro de 1613, era espanhola de nascimento (andaluza) mas revelou-se uma rainha bastante ciosa dos interesses portugueses.

O casamento entre Luísa de Gusmão e o Duque de Bragança, promovido pelo ministro castelhano conde-duque de Olivares, foi uma peça da estratégia de fusão dos reinos de Portugal e Espanha, mediante a união das duas casas ducais mais importantes e, dessa forma, refrear as tentativas de rebelião portuguesas contra a dinastia filipina.

Mas Luísa de Gusmão não só não apoiaria a política de anexação de Portugal como incitou o marido contra o domínio espanhol, vencendo a sua tibieza e convencendo-o a aceitar a coroa que lhe era oferecida pelos conjurados e pelo Povo, com a restauração de independência, após a revolução vitoriosa de 1º de Dezembro de 1640.

Na última hora, na hora das hesitações, quando o duque de Bragança, convocado por Filipe de Espanha para se apresentar em Madrid e, por outro lado, intimado pelos conjurados a aceitar a coroa, se mostrava como sempre hesitante quis consultar sua mulher e encontrou nela a resposta altiva e varonil de que “mais vale morrer reinando, que acabar servindo”...

Mas quem hoje lembra a frase que a História regista? Nem sequer o feriado o 1º de Dezembro nos poupam!...

As “rainhas” actuais são de outra estirpe. Hoje, como ontem, as classes possidentes e seus representantes nos órgãos de Estado, tomam partido, não pela independência do País, mas pelo domínio estrangeiro. Como se o traidor Miguel de Vasconcelos fossem, prestam vassalagem à “imperatriz” Ângela e, com zelo de serviçais, vergam a espinha perante as ordens da tróica estrangeira…

A história, no entanto, não acaba aqui. Outras “Luísas”, que no duro quotidiano da vida actualsobem, que sobem, sobem a calçada”, fazem caminho na dura luta pela emancipação social e pela independência do País.

  







sexta-feira, dezembro 02, 2011

COMBUSTÃO DE SARÇA...

Comprime-se o horizonte na órbita dos dias
O azul esmorece e as vagas são espuma sem memória
Apenas pulsar da Lua no deserto das rochas
E a outra face lamacenta que explode
No quotidiano das algas. E na cor esverdeada dos limos…

Os homens revestem-se de agasalhos. Sombrios.
Até as crianças se degolam. As guloseimas
São agora a exibição dos juvenis corpos na impudícia
Que os pais desnudam no lucro das marcas
E no aplauso de plateias. Como se plástico fosse
Oiro de lei das criaturas ou o peso das almas…

Nego-me. Sou apenas cinza na combustão da sarça.
E a pedra rústica em que tropeço. E a hora desmaiada
Da tarde em que desfaleço. E esta teima.
E a agitação da febre. E esta inesperada força
Que em braçadas de náufrago se ilumina…

Sem Pena ou Magoa

  Lonjuras e murmúrios de água E o cântico que se escoa pelo vale E se prolonga no eco evanescente…     Vens assim inesperada me...